Primeiramente, em tempos de viroses diversas, espero que você esteja bem. Faz tempo que não posto aqui, eu sei. Até por isso desisti de estabelecer uma periodicidade. Me desculpe por isso. Um dia melhoro. Ou quem sabe um dia a vida me proporcione mais tranquilidade. Ou, ainda, eu proporcione mais calmaria para a minha vida.
Apesar de ser tempo de falar sobre a Flip, este ano prefiro deixar as sensações pós-festa literária de Paraty se remexendo aqui dentro, vivenciá-las no silêncio dos meus dias solitários e abarrotados de tarefas. No entanto, há algo que a Flip me despertou: a reflexão sobre os caminhos de um livro — mais especificamente do meu livro. No ano passado, quando estive em Paraty, ainda não tinha um livro publicado. O “maquinário feminino e outras conversas” só foi lançado em março deste ano. Assim, estar na Flip como autora publicada me fez pensar sobre quais estradas o “maquinário” tem rumado.
Ouso dizer que toda pessoa que publica um livro cria uma expectativa sobre o seu percurso. Eu não sou diferente. Você talvez não seja também, então pode ser que se identifique com o que trago aqui hoje. Quando me refiro a expectativa, não estou falando dela de uma única maneira. Ela pode ser baixa, média ou alta. E justamente por isso pode nos frustrar ou nos surpreender.
Quanto à minha experiência, nove meses após a publicação, preciso dizer que houve surpresa. Primeiro porque escrevo poesia (e as pessoas leem bem menos poesia do que eu gostaria); segundo porque muitas pessoas enxergam a literatura produzida por mulheres como literatura de nicho; terceiro porque sou uma autora dando os primeiros passos, lançando um primeiro livro; quarto porque sei que corri riscos usando um título que convoca quem lê a refletir a partir de um imaginário vivenciado por mulheres — e preciso dizer que estava completamente ciente disso.
A surpresa quanto ao “maquinário” tem a ver com o fato de o livro ter circulado muito mais do que eu poderia imaginar. Chegou a gente que eu nem imaginava que pudesse chegar; chegou a gente que leu e gostou muito; chegou a gente que leu e gostou; chegou a gente que leu e ficou em silêncio; chegou a gente que talvez não tenha lido; chegou a gente que provavelmente tenha deixado na estante acumulando poeira ou abandonado em uma gaveta de mesinha de cabeceira; chegou a gente que possivelmente nem abriu o pacote, deixando-o depositado numa pilha, junto a outros pacotes; chegou a gente que não deve ter gostado, mas que não disse nada a respeito (pelo menos não publicamente); chegou a gente que pode ter vendido para algum sebo ou doado para alguma biblioteca.
Ainda que nem todas as chegadas sejam felizes, elas aconteceram — e isso importa muito. Pode ser que aquele exemplar habitando a pilha de outros exemplares em algum momento ganhe outro destino e seja lido. Pode ser que não. Os livros e os seus encontros com as pessoas têm seus mistérios. E, bom, me parece bonito acreditar nestes mistérios, por isso confio que, sei lá, alguma coisa muito pequena mas significativa aconteça: imaginar alguém tropeçando em algum desses exemplares esquecidos por aí e se encontrando com ele, com as minhas palavras.
Nas dedicatórias que faço há um padrão: eu escrevo com o desejo de que as pessoas se encontrem com meus versos. Entretanto, nem sempre os encontros acontecem, ou melhor, nem sempre acontecem da forma como a gente espera. E é justamente por isso que o caminho trilhado pelo “maquinário” até aqui já ilumina meus olhos e me faz ter vontade de seguir, porque sei houve muitos encontros que significaram bastante — e isso me basta.
No final das contas, escrevo pelos encontros, esperando que ninguém coloque “encontro” no rol de palavras gastas. Todas as palavras estão desgastadas e tanto faz qual a recorrência do seu uso. O fato é que eu escrevo, sim, pelo meu encontro com as palavras, e publico pelo meu encontro dessas palavras com as pessoas, porém sem perder de vista que está tudo fora do controle. Ninguém controla a trajetória de um livro. E que bom.
Delícia pensar nesses encontros que os livros trazem! Muito bom e inspirador ler sobre as expectativas de um primeiro livro.
que delícia te encontrar aqui, em Paraty e onde mais a poesia nos levar.